Mário de Andrade e Câmara Cascudo |
Embora
Mário de Andrade seja conhecido por seu trabalho como romancista e poeta, o escritor paulista também desenvolveu um
fabuloso trabalho como antropólogo, etnólogo e cronista da terra. A dislexia intelectual brasileira fez com que jornalistas e intelectuais dessem um importância exagerada ao Mário de Andrade do Macunaíma e escanteassem o músico e pesquisador. Movidos pelo afã da inovação e pelo modernismo fácil, os membros da casta ilustrada erigiram altares ao ‘herói sem caráter’, mas olvidaram os ‘Carusos do Sertão’ e os perpetuadores da tradição popular descobertos nas andanças do folclorista.
Em 1935, Mário de
Andrade fundou um centro de pesquisas culturais que viria a ser o suporte
necessário para alavancar uma série de pesquisas etnográficas, sobretudo no
campo da pesquisa e catalogação das manifestações musicais do Norte e Nordeste
brasileiros. Esse centro, aliás, tinha ousada missão: "conquistar e divulgar para todo país a cultura
brasileira".
A
intensa atividade de campo dirigida por Andrade deu origem a fascículos essenciais da cultura popular brasileira. O livro denominado ‘Os Cocos’, por exemplo, contém uma das mais completa
seleções eruditas de cantorias de festa, danças e cantos de trabalho. Mário de Andrade, entretanto, acabou se
deparando com um problema de ordem metodológica:
‘"Antes
de mais nada convém notar que como todas as nossas formas populares de conjunto
das artes do tempo, isto é cantos orquéstricos em que a música, a poesia e a
dança vivem intimamente ligadas, o
coco anda por aí dando nome pra muita coisa distinta. Pelo emprego
popular da palavra é meio difícil a gente saber o que é coco bem. O mesmo se dá
com 'moda', 'samba', 'maxixe', 'tango', 'catira' ou 'cateretê', 'martelo',
'embolada' e outras. (...)
Coco também é uma
palavra vaga assim, e mais ou menos chega a se confundir com toada e moda, isto
é, designa um canto de caráter extra-urbano. Pelo menos me afirmou um dos meus
colaboradores que muita toada é chamada de coco" [1]
É
nesse labirinto de denominações e modos que o antropólogo Mário vai buscar as pegadas de um Brasil que ainda estava vivo nas festas, lendas e costumes do povo.
É
preciso redescobrir Mário de Andrade.
[1] ANDRADE,
Mário de. Os cocos. Prep., introd. e notas de Oneyda
Alvarenga. São Paulo, Duas Cidades; Brasília. INL/Fundação Pró-Memória, 1984